Jornalista faz um balanço da safra e apresenta projeções futuras

Jornalista faz um balanço da safra e apresenta projeções futuras

O entrevistado desta edição da Revista Castrolanda é o jornalista Giovani Ferreira, atualmente responsável pela plataforma multi editorial de agronegócio nos veículos do Grupo Paranaense de Comunicação. É idealizador e  coordenador da Expedição Safra, levantamento técnicojornalístico da produção de grãos que instituiu um novo indicador de safra no Brasil. Realizado há 11 anos, o projeto percorre 16 estados brasileiros e regiões produtoras de outros 12 países da América do Sul à América do Norte, Europa e Ásia.

Giovani Ferreira também idealizou o Fórum de Agricultura da América do Sul que anualmente reúne no Brasil especialistas de dezenas de países para discutir as tendências do agronegócio mundial. O jornalista é formado em Comunicação Social pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e pós-graduado em Agronegócio pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP) e em Gestão Estratégica de Marcas pelo Instituto Internacional de Ciências Sociais e Universidade de Navarra (Espanha).

A seguir, o convidado faz um balanço sobre a safra 2017/2018, comenta sobre os reflexos das safras de outros países na safra nacional e apresenta projeções para as próximas colheitas. Confira a entrevista. 

A colheita da safra 2017/2018 está no fim. Qual o balanço da safra brasileira?
O ciclo 2017/18 começou com muita apreensão no campo por conta do clima. A previsão apontava para um ano de La Niña, que em tese significa mais chuva e precipitação bem distribuída na metade Norte do país. E menos chuva e mal distribuída na metade Sul do mapa. Ocorre que, com raras exceções, como no Rio Grande do Sul, o clima surpreendeu e no balanço favoreceu uma safra surpreendente e histórica em termos de volume. Com exceção da Expedição Safra, no início do ciclo todas as projeções apontavam para uma safra de grãos menor em relação ao ciclo anterior. Ao final da temporada, no entanto, devemos fechar a safra 2017/18 com 221 milhões de toneladas, variação positiva de 1,5% em relação a 2016/17, conforme indicador e metodologia de pesquisa apurada da Expedição Safra. O desempenho positivo é puxado pela soja, com 115,5 milhões de toneladas (+4,8%), seguido pelo milho, com 89,2 milhões de toneladas (-4,7%). O maior tombo do cereal foi no milho de verão, com volume 14,7% menor, para 27,97 milhões de toneladas.

Como foi a safra nos EUA e Argentina e quais os reflexos na safra brasileira? Qual o posicionamento da China neste contexto?
Em relação ao Estados Unidos, a safra recorde de 2017 já influenciou o plantio do ciclo 2017/18 no Brasil, como por exemplo na redução de área e produção de milho. Mas o que importa agora são as projeções para o ciclo 2018, em fase inicial de plantio. Os norte-americanos devem plantar área menor de soja e de milho, com consequente redução na produção das duas principais commodities. Serão 35,6 milhões de hectares destinados ao milho e 36 milhões de hectares de soja. Pela primeira vez, em 35 anos, a oleaginosa deve ultrapassar a extensão cultivada com o cereal. É uma mudança estrutural na agricultura do país, que sempre teve no milho a principal aposta no campo. A expectativa é de uma produção de 115 milhões de toneladas de soja (-3,5%) e 348 milhões de milho (-6%). Outro dado interessante é que a considerar a área ocupada, a agricultura dos Estados Unidos está estagnada. Nos últimos 5 anos, as oito principais culturas do país ocupam entre 104 e 102 milhões de hectares. 

Na Argentina, o efeito do clima foi perverso. O sol dizimou parte da safra. Quando as primeiras projeções foram divulgadas, o país esperava colher 57 milhões de toneladas de soja. Colheu 18 milhões a menos. Foi a pior estiagem em 30 anos. A quebra da safra argentina, no entanto, foi uma boa notícia para produtores de outros lugares do mundo, principalmente no Brasil. A redução na oferta da América do Sul fez que a soja saltasse dos US$ 9/bushel para mais de US$ 10/bushel. Com a ajuda do câmbio, apreciado nos últimos dois meses, no mercado nacional os dois fatores contribuíram para elevar a saca de soja da casa dos R$ 60 para picos acima de R$ 80/saca nas últimas semanas.

A China, que respondeu por mais de 70% das exportações de soja pelo Brasil em 2017, deve aumentar suas compras no Brasil em 2018. Não apenas pela quebra na Argentina, mas como represália à política internacional do governo Donald Trump, nos Estados Unidos, que patrocina uma batalha comercial com o país asiático. Bom para o Brasil, mas nem tanto. O cenário só faz aumentar a dependência da soja brasileira do mercado chinês. O Brasil, precisa de maneira urgente, diversificar suas exportações para outros países e dar mais capilaridade ao mercado da soja, sob pena de comprometer o avanço de área e produção verificado na última década.

A que se deve o crescimento da área plantada de soja em detrimento a área de milho?
A soja ganha terreno em detrimento a área de milho por questões econômicas e de rentabilidade. Quando a cotação do bushel ou da saca de soja for equivalente ou maior que 2,5 vezes a do milho, começa a ficar mais vantajosa a aposta na oleaginosa. É claro que existem questões de manejo e rotação de culturas que impedem uma virada ainda maior da soja em relação ao milho. Tem ainda a questão da liquidez da soja no mercado internacional. Vale lembrar que das 350 milhões de toneladas de soja produzidas no mundo, mais da metade, aproximadamente 165 milhões de toneladas saem dos campos da América do Sul.

Outra variável que impactou sobremaneira na redução da área de milho foi a safra recorde e os preços deprimidos no ciclo 2016/17. A grande safra e os baixos preços desestimularam o cultivo do cereal, principalmente no verão, com drástica redução de área e produção. De qualquer forma, com área e produção menor no ciclo atual, e forte demanda para exportação, o fato é que o produtor que apostou no milho está sendo relativamente bem remunerado. No Paraná, a saca de 60 quilos do cereal é cotada acima dos R$ 30. 

O Brasil tem possibilidade de expansão de sua produção? Onde se concentram as melhores oportunidades?
Não tenho dúvida. Dobramos a produção de soja e milho na última década. E temos todas as condições técnicas e mercado para um novo salto até 2025. Não seria nenhum sonho dobrar novamente. Ou então, sendo mais pé no chão, seguramente vamos aumentar em no mínimo 50% o volume de soja e milho, para 170 milhões de toneladas e 140 milhões de toneladas, respectivamente. A grande oportunidade, além da soja, está na exportação de milho. Há 15 anos o Brasil praticamente não exportava milho. Hoje estamos embarcando quase 30 milhões de toneladas, com potencial para em um curto espaço de tempo embarcar 50 milhões de toneladas. O consumo interno atual, próximo de 55 milhões de toneladas, pode ir rapidamente para as 80 milhões de toneladas impulsionado pela indústria de carne e de etanol de milho. Se considerarmos um estoque entre 5 e 10 milhões de toneladas, pronto, a produção tem potencial para as 140 milhões de toneladas.

Com relação aos preços, como o mercado se posicionou nesta safra 17/18? A oferta correspondeu a demanda?
A considerar o aumento da população e o poder aquisitivo dessa população, a produção em tese cresce de maneira orgânica do lado da oferta. Isso no mundo. Ocorre, que fenômenos e variáveis fora da curva podem acelerar o apetite do lado da demanda e pegar a oferta de surpresa. Foi um pouco o que aconteceu com o Brasil na última década. E que de certa forma revelou uma capacidade muito grande e dinâmica do produtor brasileiro de responder rápido às oportunidades colocadas pelo mercado. Na última safra, por exemplo, assumimos a liderança absoluta na exportação de soja, a frente dos Estados Unidos. Fizemos 68 milhões de toneladas de soja, contra 56 milhões embarcadas pelos concorrentes norte-americanos. Ainda nesta safra, em especial, de novo vale lembrar da quebra argentina, na soja e no milho, o que favorece as exportações do Brasil. E também o posicionamento dos EUA no mercado internacional, o que de certa forma amplia ou abre novos mercados à produção brasileira. É o caso não apenas da China como do México, que no ano passado dobrou suas compras de milho do Brasil em relação a 2015 e em 2018 deve dobrar novamente em relação a 2017. São situações que ampliam o interesse pela produção do Brasil, com reflexo direto e positivo nas cotações dos grãos.

Quais as projeções para a safra de inverno e para a próxima safra de verão?
A safrinha ou 2ª safra de milho, em fase final de colheita, cresce 0,6% em produção, para 61,24 milhões de toneladas. O destaque fica com o trigo. Com uma retomada em relação ao ciclo anterior, o cereal tem potencial para 4,9 milhões de toneladas no país, crescimento de 3,75%. Ainda assim, com uma produção muito aquém da demanda interna, estimada em 12 milhões de toneladas, o que deixa o Brasil refém e altamente dependente da importação do cereal. Em relação à próxima safra de verão, vamos analisar as duas principais variáveis. Primeiro o clima, que segue para uma previsão de neutralidade, mais próximo da normalidade, o que pode ser favorável ao evitar os extremos, em especial de precipitação. Embora aumente imprevisibilidade. Sobre o mercado, a se confirmar a redução na produção e consequentemente nas exportações dos Estados Unidos, uma oportunidade para o Brasil produzir e exportar mais soja e milho. Em 2018 o país tem potencial para embarcar mais de 70 milhões de toneladas de soja e 32 milhões de toneladas de milho. Na soja, com um crescimento de apenas 3% na área, podemos também superar os EUA em área e produção.

Estamos em ano político, quais impactos esse momento traz para o agronegócio?
Estou seguro que a crise no Brasil não é econômica. Mas política, com severos danos econômicos, que também afetam o agronegócio. Contudo, a vocação natural do Brasil, de produzir e gerar divisas através da agricultura e pecuária, faz com que o setor absorva mais o impacto negativo destes quase cinco anos de estagnação e mais recente recessão no país. Recessão essa que começa a ser vencida com o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) de 2017, quando o indicador nacional cresceu 1% e a agropecuária 13%. Em valor adicionado, 70% do crescimento da economia nacional em 2017 veio da agropecuária e 30% dos demais setores da economia. Então, eu não avaliaria os impactos ou o futuro do agronegócio apenas sobre a perspectiva das eleições. A instabilidade no câmbio e nas taxas de juro, que geram maior ou menor insegurança no campo e antecipam movimentos de mercado e de investimento, infelizmente é típica em ano eleitoral. É preciso conviver e aprender. Eu acredito que o ano é de desafios e oportunidades para aumento de área e produção, maior exportação de soja e consolidação na exportação de milho. Que o câmbio acima de R$ 3,20 favorece embarques e que a política protecionista dos EUA impulsiona o mercado brasileiro. Sobre as eleições, que Deus abençoe o agronegócio e o Brasil do agronegócio.